Robert Doisneau

ROBERT DOISNEAU
O TEMPO E A CIDADE

As fotografias de Doisneau a preto e branco trouxeram-me à memória a Câmara Obscura, que permitiram a descoberta das propriedades da luz como a origem das imagens, e cujo estudo recua ao tempo das pirâmides.

Decorreu uma longa jornada até a descoberta da fotografia como forma de registar imagens e, a partir daí, o explorar deste medium como forma de expressão.

O desenvolvimento de novas câmaras fotográficas com filme de celuloíde, com maior mobilidade e manuseamento, foram importantes feitos que permitiram ultrapassar os inconvenientes dos primeiros estúdios fotográficos.

Estas conquistas técnicas permitiram aos fotógrafos desenvolverem os assuntos que quisessem.

No caso de Robert Doisneau, ele escolheu uma cidade de grande importância no mundo ocidental: Paris, a Cidade das Luzes.

As fotografias a preto e branco de diferentes fotógrafos como Robert Doisneau, Henry Cartier-Bresson, Janine Niepce, Ansel Adams, Manuel Alvarez Bravo e muitos outros, transcendem os tempos, e conquistaram um lugar no panteão das obras que sobressairam no seu tempo.

De facto, um dos aspectos mais irónicos na fotografia é o tempo, sendo o parâmetro operacional de uma boa exposição e, que leva a uma boa fotografia. A fotografia também suspende o tempo numa fracção de segundo, é a vida captada num breve instante, e tantas vezes sem se dar por isso, e que depois é ressuscitado e projectado para a posteridade. Tal é a natureza da fotografia, sempre regida pelos diferentes conceitos do Tempo.

O que nos surpreende nesta exposição é que numa era de gratificação instantânea, de comunicação global, de fotografia digital, somos relembrados de outros tempos, não muito distantes, em que se necessitou da versão Yin de uma imagem captada no negativo de um filme para, mais tarde, ser revertida na versão Yang num papel.
Todo este processo levou tempo, e exigiu dedicação e técnica.

Se a técnica é um importante requisito para um fotógrafo, é somente a sua base. Foi preciso bem mais do que isso a Robert Doisneau para conseguir tirar as fotografias da sua querida Paris. Foi necessária a compreensão das características sociais, humanas e citadinas de Paris, que ele tão bem retratou nas fotografias patentes nesta exposição.

A compreensão cultural tem uma importância fundamental, pois a cultura é a moldura do conhecimento e compreensão da existência humana e comunicação, na qual todas as expressões artísticas e formas de vida existem.

Doisneau compreendeu a essência das cidades, sobretudo da sua adorada Paris, como um organismo vivo, como uma interacção entre as ambiências citadinas e os seus habitantes; um diálogo da cidade como um legado cultural e os seus filhos, seus descendentes e ainda assim construtores da mesma cidade, como em qualquer outra cidade.

Visitar a exposição “Robert Doisneau: O Tempo Reencontrado” é fazer uma viagem pelo tempo, de que já mencionei. É uma viagem através de uma visão composta do que consideramos pouco familiar nos nossos dias: a ausência de cor.

Mas, é esta ausência de colorido com que nos vamos familiarizando no nosso quotidiano, que confere magia a esta exposição, apresentada no século XXI.

A cor tornou-se demasiado óbvia, e é a directa reprodução dos nossos sentidos. Vivemos num mundo de cor.
As fotografias a preto e branco levam-nos a um outro nível de percepção e (novamente) de tempo. Nesta exposição desafiamos o visitante a descobrir um mundo que coloca as imagens num tempo, mas espero que possa também compreender a essência do trabalho de Robert Doisneau através dos retratados, que respiram ofegantemente num certo tempo e cultura.

Se completarmos este desafio, se estabelecermos um diálogo com o fotógrafo, certamente conseguiremos viajar através do olhar de Robert Doisneau até aquele tempo e cultura bem específico de Paris. Isso é, de facto, comunicação: e requere um visitante receptivo para viajar até ao “Robert Doisneau: O Tempo Reencontrado”

Antonio Conceição Júnior
Comissário da exposição